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O apelo daqueles pasteis fresquinhos, tinham-na distraído, e deixara-a ali mais tempo do que o habitual. Quando tinha voltado à realidade, reparara que numa das mesas e acompanhada de 2 crianças estava uma mulher elegante que lhe parecia a Catarina.
Há muitos anos atrás teria sido uma alegria um encontro daqueles. Teriam partilhado beijos, abraços, risos e confidências entre chá e scones. Estariam no primeiro ano de faculdade.
Hoje tudo era diferente.
Catarina concretizara seu sonho e exercia a advocacia com empenho e sucesso. Mas para Pilar a vida tinha sido madrasta.
Às vezes pensava que a sua vida daria para Gabo escrever um …" Ninguém escreve à Pilar".Metera-se em drogas mal chegara à faculdade. Drogas duras e cada vez mais pesadas.Batera no fundo.
Ao tentar recuperar, já tinha perdido a pouca família que tinha, os pais e um irmão. Tentou mudar de vida por amor, mas mesmo aí tudo falhara. Sem heranças, e a habitar em casa dele, de repente viu-se trocada por outra, e só encontrou a rua como lar, com a roupa e uma parca mochila.
Não tinha a quem recorrer. Iria agora fazer parte de 1 em cada 6 pessoas no mundo que viviam em situação de pobreza.Na primeira semana chorou.Na segunda semana tentou adaptar-se.Na terceira semana tentou sobreviver.A economia moderna não lhe perdoava.
Já com a dentição precária, com voz trémula e o seu curriculum de substâncias proibidas, ninguém lhe dava uma nova oportunidade. Era considerada não rentável. Hoje em dia era mais um pobre. Uma sem abrigo. Fazia parte de uma estatística. Era mais ou menos assim que se chegava aqui ------> à pobreza total.
À noite ia até junto da Sé da cidade onde distribuíam sopa e pão.No Inverno tentava dormir no Abrigo dos Pobres, mas no verão deixava-se adormecer pelos bancos do jardim da Boavista, com uns cartões a cobrir-lhe o corpo. Sempre que podia buscava jornais já inutilizados para ler. Se tivessem contos, melhor ainda.Havia dias em que ia espreitar a montra dos pasteis, às vezes tinha a sorte e alguém à saída oferecia-lhe 1 ainda quentinho.
De repente seu olhar e o de Catarina cruzaram-se. Esperava não ter sido reconhecida. Afastou-se discretamente da montra da pastelaria.
Virou-se e com passos apressados só tinha um único objectivo: virar a esquina.
Ainda ouviu uma voz: Pilar!!!!! Pilar!!!!!
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(out 2007 -Dia Intern pr Erradicação da pobreza)
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